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Será possível prever a evolução?


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19/04/2017. Texto por Marta Daniela Santos.

Será possível prever a evolução? Um novo estudo publicado esta quarta-feira na revista Scientific Reports (*), liderado por investigadores do cE3c, contribui para esta questão muito debatida no meio científico, estudando a evolução em laboratório de populações de moscas-da-fruta Drosophila subobscura durante trinta gerações.

Resumir em poucas palavras o conceito de evolução é um desafio. Podemos começar por afirmar que corresponde à mudança, ao longo das gerações, das características hereditárias de uma população. Estas mudanças ocorrem ao nível dos genes, mas a seleção natural – um dos principais mecanismos através do qual estas mudanças ocorrem – atua ao nível da expressão desses genes nos indivíduos – que define as suas características fenotípicas, incluindo aquelas que lhes permite fazerem face aos desafios do ambiente. Aqueles que estiverem melhor adaptados ao ambiente que os rodeia têm uma maior probabilidade de sobreviver mais tempo e transmitir os seus genes à próxima geração.

Será a evolução previsível, repetível? Os estudos experimentais até agora realizados, sobretudo em vírus e microrganismos, demonstram existir algum grau de repetibilidade, sobretudo no fenótipo. Mas a maioria dos estudos comparam a evolução de populações que têm como ponto de partida um ancestral muito próximo. Serão as conclusões diferentes se as populações analisadas tiverem histórias evolutivas contrastantes?

No estudo agora publicado os investigadores estudaram a evolução experimental em laboratório, ao longo de trinta gerações, de populações de moscas-da-fruta da espécie Drosophila subobscura recolhidas em Adraga (Portugal) e em Groningen (Holanda) em 2010. De seguida, compararam com os resultados obtidos ao realizar evolução experimental nas mesmas condições com populações de D. subobscura recolhidas em 2013, nos mesmos locais.

Pedro Simões, investigador do cE3c e primeiro autor do estudo, explica: “Neste estudo mostramos que as alterações evolutivas ao nível do fenótipo são bastante previsíveis. Isto porque tanto nas populações de 2010 como nas de 2013 se verificou uma convergência evolutiva entre as populações dos diferentes locais em termos da performance de várias características, como a fecundidade e resistência a stress. O mesmo já não se verifica ao nível genético (inversões cromossómicas) pois obtivemos indicações de convergência nas populações de 2013 mas não nas de 2010” .

Os investigadores são prudentes na interpretação dos resultados: o facto de terem encontrado um padrão de evolução convergente para várias características não permite afirmar que a evolução será sempre convergente, pois foram apenas analisadas as primeiras trinta gerações. Estudos mais longos podem revelar divergências posteriores. Este é aliás um dos objetivos a longo prazo da equipa: “A dinâmica das populações a longo prazo pode-se revelar bastante diferente da verificada num período mais curto de adaptação. Nesse sentido será importante verificar até que ponto os resultados até agora obtidos são, ou não, reforçados com mais gerações decorridas. Estamos também a analisar o genoma destas populações para tentar perceber se elas atingem estados adaptativos semelhantes usando os mesmos ou diferentes genes”, explica Pedro Simões. “Em última análise, pretendemos perceber até que ponto a evolução é previsível desde os genes até aos fenótipos” , conclui o investigador.

Imagem de destaque: imagem de inversões cromossómicas.

Ao lado: trajectórias evolutivas fenótipicas. Os gráficos representam trajectórias evolutivas, neste caso representando a evolução da fecundidade nas diferentes populações - os três gráficos representam três parâmetros de fecundidade diferentes. No eixo dos XX estão as gerações decorridas desde a introdução das populações no laboratório, e no eixo dos YY estão os valores de fecundidade (standardizados relativamente a uma população controlo). As diferentes rectas representam a trajectoria evolutiva de cada fundação (conjunto de três populações da mesma origem, exemplo PT1, PT2 e PT3 - está representado o ponto médio das três) baseada nos varios ensaios realizados ao longo do tempo. As cores indicam fundações de diferentes locais (azul - Groningen, vermelho - Adraga) e as formas geométricas dos pontos e rectas indicam os diferentes anos de colheita das populações (recta tracejada+triangulo=2013; recta completa+quadrado=2010).

(*) Simões, P., I. Fragata, S. G. Seabra, G. S. Faria, M. Santos, M. R. Rose, M. Santos and M. Matos. 2017. Predictable phenotypic, but not karyotypic, evolution of populations with contrasting initial history. Scientific Reports.


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