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Projeto internacional estuda a decomposição das folhas no solo usando… saquinhos de chá

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9/03/2018. Texto de Marta Daniela Santos. Fotografia de Simon Peter Fox.

O projeto internacional TeaComposition, no qual Portugal participa no âmbito da rede LTSER (Long-term socio-ecological research), está a estudar como é que as condições do ambiente influenciam a decomposição das folhas mortas de plantas caídas no solo, usando… saquinhos de chá. O projeto é patrocinado pela UNILEVER, a empresa que produz o chá Lipton, que fornece os lotes de chá para os locais experimentais um pouco por todo o mundo, e decorre ao longo de três anos. Os resultados começam agora a ser publicados (*), e vão permitir pela primeira vez compreender de forma padronizada este processo fundamental que permite a reposição dos nutrientes do solo ao nível global.

Olhando com atenção num qualquer jardim ou espaço verde, observamos uma fina camada de folhas mortas caídas no solo. A decomposição ao longo do tempo desta camada – a que também se chama folhada – é auxiliada por microrganismos, como fungos ou bactérias, e permite repor os nutrientes do solo, fundamentais para as plantas.


Os estudos experimentais realizados até agora para analisar este processo não permitiam a comparação de resultados, pois eram realizados com diferentes metodologias e diferentes tipos de folhada, dependendo do local onde eram realizados. O projeto TeaComposition propõe-se estudar este problema com… saquinhos de chá, que replicam as folhas caídas. Colocando os mesmos dois tipos de chá – verde e rooibos – em diferentes regiões do globo, os investigadores podem analisar como é que diferentes folhas se degradam comparativamente e qual a influência do ambiente.

Milhares de saquinhos de chá foram enterrados no verão de 2016, em 336 regiões do planeta distribuídas por todos os continentes com exceção da Antártida, representando ambientes com diferentes condições de temperatura, humidade e tipo de solo, e tirando partido da rede internacional de sítios e plataformas de Investigação ecológica de longo prazo (ILTER – International Long Term Ecological Research network). Portugal está representado com dois locais experimentais,  Companhia das Lezírias (Benavente) e Ria de Aveiro, ambos parte da rede ILTER. Os primeiros resultados, com a avaliação dos fatores que influenciam a decomposição nos primeiros três meses, foram agora publicados na revista científica Science of the Total Environment (*).

“As folhas de chá verde têm um elevado teor de celulose e, por isso, já esperávamos que tivesse uma decomposição rápida; já as folhas de chá rooibos têm mais lignina e, por isso, esperávamos uma decomposição lenta”, explica Helena Serrano, investigadora do cE3c – Centro de Ecologia, Evolução e Alterações Ambientais (Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa) e coordenadora dos trabalhos de campo desta iniciativa em Portugal. “Estes resultados indicam que o fator mais importante que explica a taxa de decomposição nos primeiros três meses é a composição da folhada, que explica 65% da variabilidade dos resultados a nível mundial. O efeito do clima é mais ténue – só tem efeito significativo em condições muito desfavoráveis, por exemplo pouca humidade; e o tipo de uso dado ao solo também não mostrou efeitos significativos nesta primeira apreciação dos resultados. No entanto, os próximos resultados, com os dados para a decomposição ao longo de um, dois e três anos, podem revelar que outros fatores se tornam mais prevalentes para explicar a decomposição desta folhada”, acrescenta a investigadora.

O projeto TeaComposition é coordenado por Ika Djukic (Agência do Ambiente, Áustria) e nele participam mais de 250 investigadores de 190 instituições científicas de todo o mundo. É patrocinado pela UNILEVER, a empresa que produz o chá Lipton, que fornece os lotes de chá utilizados em todo o mundo - a variedade de chá verde utilizada nesta experiência nem sequer é comercializada em Portugal; os lotes foram enviados diretamente por correio pela empresa.

Em colaboração com a equipa internacional, os investigadores estão agora a tratar os dados relativos às medições que realizaram em junho de 2017, quando a experiência completou um ano; as medições seguintes estão previstas para junho de 2018 e junho de 2019, momento em que se prevê o final da fase experimental do projeto.

“Fatores como as alterações climáticas, ou o excesso de fertilização, podem contribuir para alterar as taxas de decomposição, por isso é muito importante estudarmos este processo não só à escala local como também à escala global. Ao utilizarmos saquinhos de chá iguais em todo o mundo garantimos que o que estamos a ver depende apenas do solo e do clima, numa escala global”, conclui Cristina Branquinho, investigadora do cE3c – Centro de Ecologia, Evolução e Alterações Ambientais (Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa) e responsável pela realização do estudo em Portugal.

(*) Djukic, Ika; Kepfer-Rojas, Sebastian;  Kappel Schmidt, Inger; Steenberg Larsen, Klaus; Beier, Claus;  Berg, Björn; Verheyen, Kris; Gacia, Esperança, et al. , Early stage litter decomposition across biomes, Science of the Total Environment 628-629 : 1369-1394.
https://doi.org/10.1016/j.scitotenv.2018.01.012

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[Wilder].


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