News

Medidas de conservação de tartarugas marinhas em Cabo Verde não são suficientes para travar a sua captura e consumo ilegal


Photos Gallery

24/05/2016. Texto por Marta Daniela Santos.

Um estudo agora publicado na revista internacional de conservação Oryx (*) demonstra que a legislação e proteção nas praias não estão a ser suficientes para travar a captura e consumo ilegal de tartarugas marinhas em Cabo Verde. Os autores do estudo (entre os quais Joana Hancock, estudante de doutoramento do cE3c) alertam para a necessidade rever as medidas de conservação vigentes, trabalhando diretamente com caçadores e consumidores.

A população de tartarugas marinhas (Caretta caretta) de Cabo Verde é considerada a terceira maior do mundo, sendo apenas ultrapassada pelas populações na Florida (Estados Unidos) e em Omã (Golfo Pérsico). As tartarugas visitam as praias para construir os ninhos e depositar os ovos. Em Cabo Verde estima-se que 85% a 90% da nidificação das tartarugas ocorre nas praias da Boa Vista, uma das dez ilhas do arquipélago.

Os esforços de Cabo Verde para proteger as tartarugas marinhas tiveram início em 1987, com a introdução de legislação que proibia a sua captura em épocas de desova. Hoje em dia, as medidas de conservação centram-se na proteção das praias através de voluntários e, em alguns casos, pela presença militar nas principais praias de nidificação e ações de sensibilização dinamizadas por Organizações Não Governamentais (ONGs) nacionais e internacionais. No entanto, registos históricos e estudos recentes continuam a evidenciar uma forte influência negativa da ação humana nos níveis de população de tartarugas marinhas no arquipélago.

O estudo agora publicado foi realizado para a Turtle Foundationem colaboração com o Instituto Nacional do Desenvolvimento das Pescas de Cabo Verde (INDP). Este estudo resulta de uma colaboração internacional no projeto de investigação que Joana Hancock (estudante de doutoramento do cE3c) desenvolveu no seu mestrado na Universidade de Exeter (Reino Unido). Em 2011 a equipa de investigadores realizou mais de quatrocentos inquéritos a habitantes das ilhas de Boa Vista e Santiago, à população em geral, e com especial foco nas comunidades de pescadores e vendedoras de peixe, tradicionalmente associados à captura e comércio de tartarugas marinhas. Foi assegurado a todos os inquiridos que as suas respostas eram anónimas.

Com estes inquéritos os investigadores pretenderam não só avaliar níveis de captura e consumo ilegais de tartarugas marinhas como também compreender se as intervenções atuais (como legislação e ações de sensibilização) constituíam a abordagem mais eficaz para promover a conservação destas espécies. Joana Hancock refere: "A captura e venda das tartarugas é feita para obter um rendimento alternativo em alturas de dificuldades económicas, aproveitando o facto de que ainda há procura desta carne por parte dos consumidores, o que indica a necessidade de uma abordagem sócio-económica da região para desenvolver medidas de conservação mais  eficazes”.

Já no final de 2015, Cabo Verde aprovou nova legislação que criminaliza a captura, abate e comercialização de tartarugas marinhas. No entanto nem sempre nova legislação traz resultados positivos, nem imediatos, sendo que na falta de uma abordagem socio-económica as medidas de conservação tendem a gerar mais conflitos do que soluções.

Como parte do seu projeto de doutoramento, Joana Hancock vai em breve adaptar este estudo à realidade de São Tomé e Príncipe, para o qual a Associação Tartarugas Marinhas (da qual Joana Hancock faz parte) recebeu uma bolsa da prestigiada Rufford Foundation no passado mês de abril. "São Tomé e Príncipe beneficiou recentemente da aprovação de uma nova lei de conservação de tartarugas marinhas, e é essencial entender quais os principais beneficiários, mas também lesados, desta nova medida, e entender a forma de promover a participação e colaboração das principais comunidades, para assegurar ações mais eficazes, e impactos mais duradouros”, refere Joana Hancock.

Press coverage: [Diário Digital], [Expresso das Ilhas].

 
(*) Hancock, J.; Furtado, S.; Merino, S.; Godley, B. J.; Nuno, A. (2016) Exploring drivers and deterrents of the illegal consumption and trade of marine turtle products in Cape Verde, and implications for conservation planning. Oryx. http://dx.doi.org/10.1017/S0030605316000107

Fotografias da autoria de Joana Hancock.


Tags: CE

Other Articles

  • Mar de plástico: Mediterrâneo é a área do mundo com maior risco para as ameaçadas aves marinhas

    Paper Mar de plástico: Mediterrâneo é a área do mundo com maior risco para as ameaçadas aves marinhas

  • Combater a extinção social das plantas e da botânica de telemóvel na mão

    Paper Combater a extinção social das plantas e da botânica de telemóvel na mão

  • Gestão de biodiver-cidades: conhecimento sobre as espécies assegura funcionamento da infraestrutura verde

    Paper Gestão de biodiver-cidades: conhecimento sobre as espécies assegura funcionamento da infraestrutura verde

  • Revista IBIS nomeia artigo de recém-doutorado do cE3c como um dos melhores do ano

    Paper Revista IBIS nomeia artigo de recém-doutorado do cE3c como um dos melhores do ano

  • Estudo mundial alerta para a degradação das zonas áridas devido ao aumento do pastoreio

    Paper Estudo mundial alerta para a degradação das zonas áridas devido ao aumento do pastoreio